sexta-feira, 10 de setembro de 2010

CAUSOS DE ASSOMBRAÇÃO A BEIRA DO FOGÃO A LENHA- CAP.II


CAUSOS DE ASSOMBRAÇÃO A BEIRA DO FOGÃO A LENHA
CAP.II

Sob a chama voraz do fogão a lenha, mal acabava um causo, alguém já emendava outra história. Desta vez foi meu pai quem seguiu contando

- “Rapaiz! Ôtra noite foi o Zé da Artiva que me feiz fugi di Carrera... Ceis sabe da história Du lubisome, num sabe”?

- “Mais o menos, cumpade. Mais conte aí, sô!”

- “Intonce vô cuntá...”

Meu pai começou a falar sobre a lenda do “lobisomem caipira”, que é bem diferente do que se costumam saber sobre essas criaturas, os lobisomens.

Lá na roça, o que se conta, não tem nada há ver com homens que viram lobo, ou lobos que viram homens. Lá, o lobisomem é um grande, enorme... PORCO.

Pois é! O lobisomem de lá, na verdade, deveria se chamar “porquisomem”, não é mesmo?

Dizem que a maldição ganha vida, quando alguém passa a noite no galinheiro e, até sem querer, come “titica” de galinha, mesmo que seja só um pouquinho que ficou grudado no lábio e a língua acabou arrebatando para dentro do estômago. È claro que este feito tem que acontecer na última noite de lua cheia, não é?

Assim, na próxima lua cheia... Eis que surge a criatura...:

- “Uai, cumpade! Disso eu sei. Mais e a tar história do Zé da Artiva.”

- “Pois num ti conto, homi”...

Corria por lá, o boato de que, durante uma briga de casal o “Zé” foi posto para fora de casa, por sua mulher Altiva, a “Artiva” como dizia o pessoal de lá. Por falta de outro lugar para se abrigar do sereno e da friagem, ele foi parar no galinheiro.

Juntou todo o capim seco que encontrou e improvisou uma cama.

O poleiro, onde dormiam as galinhas, ficava bem em cima da tal cama e, como não podia ser diferente, o coitado se tornou alvo certo de toda a “titica” produzida aquela noite e infelizmente, uma galinha de mira perfeita, acertou bem nos lábios do Zé.

Em um movimento reflexo, ele passou o braço para “limpar”, mas acabou empurrando parte da tal titica para dentro da boca e, sem ver, engoliu.

No dia seguinte, Altiva foi até o galinheiro, se desculpou com o marido e o levou de volta para a casa, onde ele tomou um belo e demorado banho de bacia, para se livrar de toda aquela sujeira.

Tudo parecia normal, até chegar às próximas noites de lua cheia.

Fazendeiros da região fizeram um grande alvoroço, pois o gado de todos, estava sendo atacado por uma criatura desconhecida e sedenta de carne e sangue:

- “Ara! Só pode ter sido uma onça, sô!”

- “Má num é não, Mané... Isso é coisa de ôtro mundo”...

Todas as noites de lua cheia, o alvoroço se repetia.

Certo dia, o pai de Altiva, ficou adoentado, sabe-se lá de quê, e a filha, preocupada, tratou de intimar o marido à levá-la à casa do pai:

-“ Mais Artiva”! Hoje é noite de lua cheia...

- “Dexe de bobera, homi! Eu lá vô tê medo de onça... Vamo logo qui eu quero chegá lá ainda essa noite”...

- “Mais hoje é noite de lua cheia Artiva”!

De nada adiantou as reclamações do marido. Altiva estava decidida a ver o pai ainda àquela noite. Arrumou sua filhinha, pegou uma grande bolsa que, é claro, seria carregada pelo Zé e se colocaram a caminho.

Antes que alcançassem a metade do caminho, o céu começou a escurecer com o dia cedendo lugar à noite.

Zé, ofegante falou para a mulher

-" Óia Artiva". Eu "perciso" í ali nu mato, "mais ocê" num fica aqui não, "pru" que "pur" aqui tem muita cobra. Suba "cum a minina" nessa pedra "arta". Daqui um poço eu "vorto i nóis" segui "viage"...

O Zé sumiu no meio do mato, enquanto a mulher esperava em cima da pedra...

Logo, redonda feito um queijo, a lua cheia surgiu no céu estrelado.

Altiva já estava inquieta com a demora de Zé, quando começou a ouvir urros e rosnados de um animal muito feroz.

Tremendo de medo, apertou a filha em seus braços e de repente viu a enorme criatura:

- “Jisus, Maria, Jusé... Zé... Zé, acuda nóis, Zé”!

O enorme porco, de presas afiadas, anca muito alta e gigantescas patas quadradas tentou ferozmente subir na pedra, quando quase alcançava a mulher e a criança, escorregava, mas não desistia e tentava outra vez.

As investidas da criatura duraram até a madrugada e segundos antes do raiar do sol, o bicho alcançou a barra da saia de Altiva, arrancando um pedaço, depois desistiu da presa e sumiu no mato.

Pouco tempo depois o Zé apereceu:

- “Homi di” Deus! “Pru que qui ocê demorô” tanto”?

- Ara! É que eu tava “cum” uma bruta dor de barriga, sô!

Exausta, a mulher não quis muita conversa e seguiram viagem.

Chegando lá, o pai de Altiva já estava recuperado e o que seria uma visita a um adoentado, acabou se tornando um almoço comemorativo. Entre um assunto e outro, começaram a contar piadas e quando o Zé deu a primeira gargalhada... Antes que meu pai:terminasse de contar, um de seus compadres o interrompeu dizendo:

- Eu sei “cumpade”, eu sei. A “Artiva” viu u fio do pedaço de saia arrancado, preso nus dente “Du” Zé e se “separo” dele ali memo, sem nem “vortá” pra “pegá” suas “ropa”...

- Pior “cumpade”, é que noite passada, “cum” a lua cheia nu céu, “vortano” pra casa, eu dei di cara “cum’ u porcão “i quano” eu tava “chegano im” casa, eu “ôvi” a “voiz” Du Zé “falano”... “Num percisa corrê” não “Gerardo”. É “ieu, sô”...

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